O mínimo cão da vizinha vivenda.
Seu ladrar proprietário.
O retorno espanholado do assentador de ladrilhos.
A vida é o mal menor.
Mínimo, o cão.
Menos que a vida.
Cão superlativo, cão gramatical.
Da peanha triangular do canto do café, o televisor emana amor de actrizes.
Maquilhado amor de brasileiras actrizes.
Mulherões.
Gostam mais de teatro, mas fazem telenovelas.
Pastilhas elásticas rosiplastificadas decompõem-se de açúcar plástico em boiões idem.
Por cima delas, o jogo dos furinhos: sai-sempre-um-brinde: um euro.
O domingo vigora na aldeia.
É de tarde, a igreja fechou-se sobre si mesma, entristecendo os santos que a um canto tentam violar, de chave de fendas nas mãos de cera, a vazia caixa de esmolas.
O próspero peixeiro, endomingado, fala de Peniche e da operação da mãe.
Hérnia elefantina.
A cozinheira do café, em seus dela cinquentas, passeia a mama pingada em redor dos homens que bebem ao balcão.
Ela é uma aparição: pingente, celeste, aventalada, ainda.
O balcão é fórmico.
Pintalga-se de baquelite como um leopardo sintético.
Ele é feliz na consumpção, na aldeia, na felicidade.
Eles saem, abandonando-o à felicidade.
Um rapaz quarentão de pulôver resiste, sozinho, ao filme da televisão.
O filme arrasta uma perseguição de carros.
Um dos detectives é preto.
O herói é branco.
Há uma santificação diegética da ladroagem.
No fim, uma bomba de relógio decrescente há-de ser desactivada a tempo.
Ainda isso é o mal menor.
Entra a inconsciente plebeia azul.
Na verdade, ela é castanha.
Franco lancil de ancas, mas bom peitoril.
Mas aqueles olhos azuis que dardejam sem literatura.
Magnetiza um namorado de motorizada e capacete, tonto de jovem, que sorri.
Saem os dois, ele sorrindo sempre, fica o porta-guardanapos, que diz “Sagres” como o Infante dos Descobrimentos.
“Homem de Deus!”, exclama a cozinheira.
O homem divino é um emplastro de oitenta anos que sorve martinis ao pé da jarra de rosas.
Já deveria ter entregado, a Deus, os oitenta anos e as outras tantas rosas.
Não o fez, porém.
Resiste, ele também, ao domingo, aparição ele mesmo, mal menor de si mesmo.
Botulho, domingo à tarde, 7 de Maio de 2006
3 comentários:
Contactos a fazer:
- josedanielabrunheiro@sapo.pt
- albertolapa@sapo.pt
-eliseuvicente@sapo.pt
Leituras e veduras a fazer:
- umbilicativo.blogspot.com
- albertolapa.blogspot.com
- eliseuvicente.blogspot.com
(busca através do google (só) e com insistência. Depois contarei o que esses f.p. que mandam nestas coisas internéticas me têm feito e por quê.
Segui a pista e encontrei.
Bom agora vou falar contigo,numa coversa cheia de recoerdos e saudes e nesta mistura de linguagens de fronteiras apagadas fico feliz porque estás aí.
Até já ...
Depois de espreitar e ler não admira que te tenham feito algo,continuas igual a ti memo sem papas na lingua nem tato nos dedos quando escreves.Amei....
Continuas fiel...mesmo que se note um toque de tristeza e amargura no bico da caneta enquando rascunhas as letras.
Nada mudou... só a trampa é que não tem o mesmo cheiro e porque será??
A como te comprendo!!!!
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