Fotografia: © Roy Decarava, Window and Stove, 1951
Palavras: Viseu, Café Paris, fim da manhã de 2 de Junho de 2008
Fui azulado pelos olhos do homem pobre da manhã.
As manhãs criam-mo na praça deserta.
Sou por ele visto, e criado, de costas na praça deserta.
Diminuo de silhueta escura afastando-me, ele
azulascura-me, os olhos dele no que sou, no que
deixo de ir sendo.
Vou sempre e nunca venho.
Ele pára em frente ao teatro encerrado, estatuário,
livre, livresco, libertino, sempre
calado, azul sempre.
Pago em pão e trinca de arroz às pombas
o quanto que lhe devo.
As mamas das mulheres bolçam figos de seiva.
Os homens coçam distraidamente as virilhas.
Lojistas do pequeno comércio bocejam metafísicas
de saldo.
A cidade, eterna por uma manhã mais, plasma
licorosos rostos de humanas medusas.
Anjos guardam jardins fechados a ferro.
E uma senhora de dentes estragados sorri na rotunda.
Fuzi(azu)lado fui pelo homem pobre da manhã.
A vida faz-se-me louça de cacos assim.
Das janelas viúvas assomam pergarrostosminhos
de velhas senhoras que olham nos olhos
a antiguidade de quem passa.
Sou visto de costas na corrente das ruas.
Populosas ruas desertas bocando praças.
Um casado de cinquentital anos descarrega caixas
de víveres à porta da minimercearia.
Uma criança amarela penteia um livro de aventuras.
Um trapo escarlate ondula ao vento hematológico.
Um gato de cal furtiva a selva de granito.
E a estragada senhora não sorri já rotundos dentes.
Aonde hei-de ir paradamente ainda?
Tudo o que sempre quis é ainda
uma choupana onde fritar toucinho,
soprar vapor de café num púcaro de folha
– mas pertenço à cidade dos homens azuis,
das crianças escarlates à amarela aventura
da seiva bolçada por guardiães-anjos.
Um restolhar de pássaros pela pele,
a barba raspada na minha cara, mas
os olhos do meu Pai no espelho,
os pássaros poisados na moldura barata do espelho.
Conheço o mapa das minimercearias,
tracejo a cartografia dos mansos loucos da cidade,
dou de cárie com as putas das rotundas,
comove-me a banca de fruta sobre que chove
a cores,
encerraram o teatro e eu não sei onde
ser de frente ante
populosa deserta azul gente.
As manhãs criam-mo na praça deserta.
Sou por ele visto, e criado, de costas na praça deserta.
Diminuo de silhueta escura afastando-me, ele
azulascura-me, os olhos dele no que sou, no que
deixo de ir sendo.
Vou sempre e nunca venho.
Ele pára em frente ao teatro encerrado, estatuário,
livre, livresco, libertino, sempre
calado, azul sempre.
Pago em pão e trinca de arroz às pombas
o quanto que lhe devo.
As mamas das mulheres bolçam figos de seiva.
Os homens coçam distraidamente as virilhas.
Lojistas do pequeno comércio bocejam metafísicas
de saldo.
A cidade, eterna por uma manhã mais, plasma
licorosos rostos de humanas medusas.
Anjos guardam jardins fechados a ferro.
E uma senhora de dentes estragados sorri na rotunda.
Fuzi(azu)lado fui pelo homem pobre da manhã.
A vida faz-se-me louça de cacos assim.
Das janelas viúvas assomam pergarrostosminhos
de velhas senhoras que olham nos olhos
a antiguidade de quem passa.
Sou visto de costas na corrente das ruas.
Populosas ruas desertas bocando praças.
Um casado de cinquentital anos descarrega caixas
de víveres à porta da minimercearia.
Uma criança amarela penteia um livro de aventuras.
Um trapo escarlate ondula ao vento hematológico.
Um gato de cal furtiva a selva de granito.
E a estragada senhora não sorri já rotundos dentes.
Aonde hei-de ir paradamente ainda?
Tudo o que sempre quis é ainda
uma choupana onde fritar toucinho,
soprar vapor de café num púcaro de folha
– mas pertenço à cidade dos homens azuis,
das crianças escarlates à amarela aventura
da seiva bolçada por guardiães-anjos.
Um restolhar de pássaros pela pele,
a barba raspada na minha cara, mas
os olhos do meu Pai no espelho,
os pássaros poisados na moldura barata do espelho.
Conheço o mapa das minimercearias,
tracejo a cartografia dos mansos loucos da cidade,
dou de cárie com as putas das rotundas,
comove-me a banca de fruta sobre que chove
a cores,
encerraram o teatro e eu não sei onde
ser de frente ante
populosa deserta azul gente.
2 comentários:
vim reler o texto anterior, que tinha lido de manhã, mas que tinha gostado tanto que quis reler e não só o reli como agora li este que também me agradou muito, muito. um grande beijinho, daniel. obrigada!
Agradeço eu, Alice.
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