Escrevi algures que a literatura e a masturbação são artes siamesas porque ambas se dedicam à emissão de pequenos, estéreis seres – personagens para nada, para ninguém. É possível que tenha tido razão. E, daí, talvez não. De facto, recordo com mais recorte e mais nitidez certas personagens do que (in)certas pessoas. Leopold Bloom, Mrs Dalloway, Biscuter, Bouvard & Pécuchet, Florentino Ariza, a S. Joaneira, Madame Francinet, Raskolnikov, Clawdia, Hans Castorp, a Mulher Canhota do Handke, Palomar, a Joaninha dos Olhos Verdes, Dinamene, Acácio, Madame Maigret, Calisto Elói, Henri Castang, o Horácio d’A Lã e a Neve, Nick Adams, Benjy, Sancho, Santiago Nasar, o Gineto, Manuel da Bouça, Heidi, Evaristo Carriego, Jim, Matt Marriott, Bernardo Soares, Austin & Mr DeLuxe, Pat Garret & Billy the Kid, Maria Eduarda, Cristo, Jacinto, Monsieur Bebé, Rodrigo, John Barleycorn, Tom Joad, Dorian Gray, Rose, Brian Ash, o Touro Azul, João Evangelista, Cyrano, Lord Edgware, Dr Watson, Jules, Juliana, Garth, Powder, José Francisco, Fernando Oliveira & Armando Oliveira, Augusto Graça, José Maria Luís, o Príncipe Valente, Cisco Kid, Afonso, Eurico, Lear, Ájax, Bill, Godot, Sir James Bellamy, Doc, Alberto & José, Teresa, Guedelhas & Maquinista, a Viscondessa de Tardinhade, o Gebo, Chico & Rosa, Nathan, Stingo, Craft & Croft (o do Eça e o do Mailer), Sophie, Lenny, Margarita, Thomas, Moll Flanders, Blue & Black (& Decker?), Jau, Kip Kirby, Magnus Pym, Karla, Electra, Deus, Clea, Janvier, Mycroft Holmes, Stephen Daedalus & Molly – nenhuma desta “gente” é estéril. Talvez, de facto, eu ande errado repetindo que “literatura e a masturbação são (…)” etc.. Talvez quem concorde comigo esteja certo – e que quem de mim discorde o esteja também. Não sei nem vou apurar. Sei que uma pessoa pode preencher-se disto. Contra o vento e contra a moral, contra o barómetro e contra o cronómetro. Como digo e disse – não sei. Sei que tenho andado – dias a fio em novelo de noites – urdindo um senhor chamado Camilo Ardenas. Quando vos apresentar, dele, a(s) história(s), não mais meu gajo será, mas vosso. Literário, onanista, contado – já vive. Para que vive, não sei. Não sabe ninguém.
Caramulo, tarde de 17 de Fevereiro de 2007
1 comentário:
Escrevi um texto sobre Florentino Ariza e Fermina Daza, que um dia destes hei-de publicar no meu blog e que é para ti.
Quanto a Santiago Nasar é do caraças. E ninguém conseguiu avisar o homem.
Juliana não sei se é a Juliana Tavira do Eça. Se é, é a personagem feminina mais execrável de toda a literatura.
O Manuel da Bouça comoveu-me até às lágrimas. Horácio também e até o velho Marreta. Vidas difíceis!
Li o Ferreira aos quinze anos e ainda hoje recordo as personagens. Eu gosto daquele pré-neo-realismo e de muitas coisas do neo-realismo. Há para aí uma cambada que sepultou o neo, mas havemos de o ressuscitar.
Há momentos em que preciso de desabafar e acabei de ter um pretexto.
Um abraço, Daniel!
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