22/11/2006

Corpo 42



Pois que
quão o suor
é a consciência tão
emanação do corpo,
escrevo isto
aos 42 anos de idade.






A aço se não reduz já o braço
– ou conduz.
Etérea lama, em lugar disso
– sombra, que não luz.

Finos vasos azuis
o sangue vazam em as unhas.
Vibra dentro o osso
– não o aço:

formigueiro de dormente medula.

A mesma adolescente espada
não singra já no ar o frio:
antes tem frio, coitada.

A alma pisa o sangue
como a vinho fora.
O corpo é um gajo sozinho:
de espelhos devorador embora.

Restam costas e virilhas.
Salsugem babuja corais
de que ilhas, por tropicais,
são alheias maravilhas.

Lord Jim, Sylvester Stallone:
clones da musculação
por via mail ou telefone
ou da coragem contrição.

O mais é livros folheados
a cuspo d’ouro proletário:
andam os corpos enganados
– não tem reforma, o operário.
Digo isto bem do alto
duma idade que se abaixa:
Montepio, monte alto,
tostõezinhos para a Caixa.

Nunca conta a maravilha
seus segredos culinários.
Eles são certos e são vários,
dão de comer a operários
e mais à mãe e mais à filha.

Tenho na tíbia fissura
que arrefecendo algia traz.
Eu sou muito bem capaz
de fazer uma loucura.

Vivo em 2006
– não sei qu’é isso,
ó bicicleta!
É uma idade obsoleta,
é o corpo enfermiço,
refractário às mesmas leis.

Poucos sonhos.
Mulheres, nem risco.
O mesmo coração confisco
de onanirismos os mais medonhos.

Vento nos cedros: azulações.
Verdes chuvadas, o tom cinzento.
O filme é mudo, o filme é lento.
A derme é fria sob os colhões.

Meu manso corpo, tu sê bravio:
não te sufoque a consciência.
És da cidade que tem um rio.
42? Pois, paciência!



Caramulo, noite de 21 de Novembro de 2006

4 comentários:

Anónimo disse...

Sou o primeiro....

Manuel da Mata disse...

Depois dos 42, a coisa melhora. Ainda há tempo para se ser um bravo. Bravio é que já é mais difícil.
Como dizia o outro, esta coisa vai ganhando novas qualidades.

Um abraço
Manuel

Daniel Abrunheiro disse...

abraço, minha gente.

Anónimo disse...

Parabéns.

Canzoada Assaltante