Acabo de receber dois exemplares desta Antologia em honra poética de Joaquim Rodrigues de Castelo Branco (Amato Lusitano) pelos cinco séculos do nascimento do médico judeu. Participo, a convite do organizador Pedro Miguel Salvado, com um texto duplo na página 38. Este aqui:
DUAS DISTRACÇÕES PENSATIVAS
DE AMATO LUSITANO TOMANDO O CHÁ JÁ FRIO
Essa
ocasional bondade de algumas pessoas
saltando-nos
à cara como um gato furioso:
quanto
me comove tal negação do Deus dos padres,
da
moral que nada quer do físico nem de físicos.
Vivi
a minha vida, estou hoje talvez morto
mais
do que nunca, dada a medicina das máquinas
e
a vigília perpétua da igreja ao fundo da rua,
a
que as almas acorrem agradecendo milagres
que
eu prescrevi, precavi e tratei como um homem.
Mas
essa ocasional bondade,
essa
galinha viva no cesto,
esse
Isto é para si, Doutor, não me queira
mal,
quanto
me move e comove,
morto
embora.
Ou
talvez não tanto assim, valha-me Deus.
Ou
um gato me valha.
*
Uma
fúria de aranhas ou de abelhas
me
volvesse cínico, não clínico.
A
superstição mais crédula me creditasse,
não
o honesto estudo nem a encanecida ciência,
essa
paciência inútil, por filantrópica.
Mas
se de Júlio César a Gália Transalpina
se
divide em partes três, já o humano coração,
havendo-o
algures, em válvulas quatro se
divide.
Divide.
Antes
unisse.
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