A cabra de Fareja
(Devo ao CM de 30 de Janeiro último o mote para as voltas desta página.)
Parece que lá muito para o Norte, numa terriola de nome Fareja (bandas de Fafe), as campas do respectivo cemitério paroquial são mais adornadas de flores plásticas que de naturais. A culpa é de uma cabra. Livre, liberta, libertina, gulosa, atrevida e impune como um sacrista pró-troika, a criatura de pés de Diabo tem ido (muito) àquele campo-santo empanturrar-se das votivas, saudosas e amáveis flores naturais com que os vivos usam colorir o preto-e-branco dos eternos repousos. A cornúpeta profanadora tem sido mais falatoriada na aldeia do que, na minha, a fuga da mulher do Meireles para a Venezuela.
Armando T., presidente da Junta lá de Fareja, anda desconsolado. Jura a pés juntos (nem de propósito, já que de cemitério falamos) que já mil-e-uma vezes tentou apanhar a cabra, mas que até agora nicles-batatóides. Já Maria A. afiança que o home’ dela também. Isto é: também não. Isto é: que o presidente amailo home’ dela e muitos outros também ainda não conseguiram apanhar a cabra.
Ora, isto desconcerta-me. Eu e a rapaziada da minha terra já teríamos há muito arresolvido o assunto: por cá, apanhar a cabra é coisa que nos é tão certa e garantida como o senhor Manoel Matusalém de Oliveira fazer filmes quietos. Eu até já vou no quarto ajuntamento de facto por ser tão expedito e diligente e constante nessa humilde versão lusa da expedição ao tigre. De modos que não me entra no bestunto a canhestrice do homenzio de Fareja. Não entra.
Claro que, mal soube da história, fui logo parlapiá-la à tasca da Rosa. O Freitas, que é muito católico, diz que o mais era excomungá-la a zagalote e dar os bocados aos pobres. O Belmiro, que tem venda, arrespondeu-l’e que dá-la era mas era o caraças, que aquilo era talhá-la em postas e vendê-la (ele) em chanfana tipo bocados de frango. O Magalhães, que diz que é maçon por ter andado de pedreiro em França, diz que sabe certezinha-absoluta que comer o natural dos outros é mando de um tal grande arquitecto que lhe costuma fazer favores manhosos nas obras. Mas, cá p’ra mim, quem acertou em cheio foi o Chico Moita, que percebe sempre muito de tudo como o Nuno Rogeiro e muito mais que os outros vadios todos, quem arresolveu de vez o caso: “Flores? Disso percebe cá o je. Vai-se a ver não é senão a mulher ali do Meireles que, em vez de fugir para a Venezuela, fugiu mas é pa’ Fafe.”
A chatice foi que o Jorgito Carvalho, que trabalhou de cantineiro na pide de agora depois do vintcinqdabril e é mais bufo que um sopro de gato, foi logo meter tudo no cu ó Meireles e claro que teve de haver porrada de criar bicho. Ora, como nem é de admiração o Chico Moita levou mais do que deu, agora só aparece cá na tasca para aí metade das vezes.
Bendita cabra.
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