27/02/2012

LIGAÇÃO À MEDUSA - 20 (fragmento 1)



Leiria, quinta-feira, 8 de Setembro de 2011

Enquanto o corpo se não desfaz lama e refaz cinza, a alegada unidade dele campeará, em pouco mais ’inda, os mistérios sobre-instantes e os subjacentes. Como por exemplo hoje, uma quinta-feira, a primeiro do último Setembro deste ano autofágico (como todos os meses, todos os seres e todas as obras destes e daqueles). Em Leiria.
Agosto foi tíbio, pusilânime, mesquinho quase. Como previsível, Setembro é de uma força-forno, uma rosa nuclear de gás-luz, o calor derrama-o em chorrilho de pedras esbraseadas que içam o coração às têmporas e quedam as têmporas ao estômago. Os pés tornam-se borracha pegajosa, os olhos atraem as moscas como as luminárias de Las Vegas, os papalvos de chapéu à cowboy. Fideísmos e ontogéneses surdem melancolicamente na ordem do dia-após-o-dia-a-noite.
Uma pessoa cede-se o direito a/de pasmar sem espanto, à maneira de animal dado sem querer nem não-querer à taciturnidade nem feliz nem descontente tão própria da comum gente.
Ninguém usa casaco, não hoje. A fornalha vibra cutiladas moles na arcada da respiração, ardendo os sacos pulmonares como foles muito ígneos, muito fatigados. E na volta da fonte, raparigas de fins do XIX repenicam chineladas de que se esparge o cristal da gotita d’água.
Escoadas de som as tamanquinhas, vibradas e delidas, longe já, as concertinas dos ranchos, arrecadado o milho (e o milho do ouro que a venda do milho-milho comprou), a pessoa-animal vê-se rearremessada de volta ao futuro do agora-apenas: tarde, Setembro, quinta-feira, Leiria, XXI, 2011 etc.

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Canzoada Assaltante