Utopias e boas
companhias
1 O senhor meu Pai
comprava todos os dias o jornal. Era o Diário
de Lisboa. Nenhum dos dois existe já. Era um senhor bom Pai. Era um senhor
bom jornal. Fui bem criado, pois: como filho e como leitor. Cheguei a desejar
escrever, um dia, naquele periódico. A realidade da extinção tornou-me
irrealizável tal utopia. Em compensação, escrevo aqui, nO Ribatejo. A vida não me foi madrasta de todo, portanto. Só tenho
pena de, chegando a casa, não poder mostrar ao meu Velhote as palavras que tão
boa companhia me fazem, a saber: as dos grandes Armando Fernandes, Arnaldo
Vasques, António Branquinho Pequeno, Beja Santos, Fernando Paulo Neves, João
Salvador Fernandes, Joaquim Jorge Carvalho, Mário Rui Silvestre e, de longe em
longe, Carlos Cruz e Carlos Chaparro. Mais o traço impagável do António Maia.
Mais tudo o que fazem os profissionais desta Casa.
Não
digo isto por mariquice sentimentalóide. Digo-o por gratidão. São quase nove
anos e meio de comunicação com as gentes leitoras de uma Região tão bela quão
mal aproveitada. Pronto, está feito e fica dito.
2 Derredor o meu par
de óculos, a Realidade quotidiana é insalubrezita. Muita (demasiada) gente sem
trabalho. As televisões industrialmente jorrando lixo. Lixo propriamente dito
pelo chão, manado por gentalha sem pinga de civismo nas ventas. Estoiros
rodoviários perfeitamente evitáveis. Incêndios criminosos. Coisas mal pensadas,
mal escritas & mal lidas. Um ror, enfim, de mediocridades que vou fazendo
por desprezar com a tranquilidade possível. Como não sou super-herói,
desforro-me na frequência agradecida de bons impressos, tais como: A Morte É um Acto Solitário, de Ray
Bradbury; Papéis Inesperados, de
Julio Cortázar; Silja, de F. E.
Sillanpää; As Grandes Correntes do
Pensamento Antigo, de Albert Rivaud; Las
Doctrinas Políticas en Portugal (Edad Media), de Francisco Elías de Tejada
Spínola; a maravilhosa Hélade,
compendiada pela também maravilhosa Doutora Maria Helena da Rocha Pereira; e
ainda, claro, o nossO Ribatejo.
Vou-me safando com algum garbo. Vou, vou.
À
maneira de despedida, sempre V. digo que, se me sair uma batelada brutal no euromilhões, reactivo o Diário de Lisboa e ponho-me Director
dele, para alegria secreta do senhor meu Pai. Há-de ser limpinho. Ou nunca, que
sempre é o mais certo.
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