01/09/2016

Rosário Breve nº 470 - in O RIBATEJO de 1 de Setembro de 2016 - www.oribatejo.pt



Mas isto sem enredos nem dramas



Durante duas semanas, não soube que fazer nem da nem à minha vida – a quinzena de descanso (aliás justo, merecido aliás) dos trabalhadores desta Casa fez com que o meu trânsito temporal pelo tórrido Agosto equivalesse, ora nem menos, a um ardente viático deserto sem fofuras frescas de oásis à miragem. Duas vezes sete dias sem uma embirraçãozinha com a Câmara – caramba, sempre é estopada, sempre é seca, é ferro sempre! Mas enfim, o Jornal está de volta. Vem arejado, ourejado, bronzeado. Vem são como um bebé de boa casta e de rosada compleição já muito capaz de seus gu-gus & de seus dá-dás.
Setembro aí está. Hoje é o dia n.º 1 dele. Já se ouvirá roncar a maquinaria de reconsolidação das barreiras? Daqui onde escrevinho, a não sinto. Talvez amanhã, útil dia também. Cuido tão-só, riscando-me porém a papalvas facetas de ingénuo, que à palavra dada se dê seguido acto – e que as orçadas obras arranquem sem mais. Nem menos.
Nisto, num sítio por acaso não longe daquele em que o meu Leitor me segue as linhas, abeira-se-me um sujeito espadaúdo de que não conheço o nome mas cujos ademanes reconheço. É de cabeça cúbica como uma esfera errada, carão de malares metalúrgicos em que negreja um bigodão de crepe lutuoso, nariz esponjoso qual framboesa feita de fígado, olhinhos desconfiados como pardais pretos e de pescoço grosso sulcado de cordoveias sujas & fortes como lianas amazónicas. No fundo como à flor, não é mau tipo. É apenas burro. É apenas mula. Gosta de atirar trocadilhos sentenciosos mas fáceis do género: “É preciso mudar as coisas do Estado para mudar o estado das coisas!”. Ou então paradoxozitos desta classe de pacotilha: “Isso foi gajo que até no morrer teve sorte!”
Ele àquela mesa, eu a esta. Moita-carrasco (sem flores de trocadilho) da minha parte. Cúnfia nenhuma. Laissez-estar, laissez-palrar. O gajo sente, manando de mim como uma febre electrostática, um silêncio de espessura de edredão. Sorrelf’olha-me de oblíquo viés. Desconfiado, ele – hoje em dia, escrever num Café sem ser no tablet ou no telelé mas sim, ainda por cima, a caneta e em papel – pode ser de grande melro, mas não grande espingarda. Sinto-o presa agónica de uma ardência comichosa. Herpes da mente, urticária da alma, psoríase da perguntação, frieira do diga-me-cá. Incapaz de açudar a torrente daquilo que matou o gato, vozeia-me ele:
Você desculpe, mas isso aí da escritura é mais nódoa atirada ao pano do sôprezdentedacambra ou quê?
Tiro os óculos para o ver mal e, sem uma palavra, meneio o capacete que não.
Mas ele:
Você desculpe se quiser, mas é qu’isto tem sido das suas partes um inzajêro, qu’ele é o home’ nas procissões todas imaizalgumas, el’é ele a birabaixo nas barreiras, el’é ele a deixar sujar o Tejo como se o Tejo num tibesse auga suficiente pa’ se lavar, el’é ele tudo e todo por coisa nenhuma.
Mazeu, sempre assilábico, de uma afonia manhosa sempre, escorneio o meu casco – que não.
Acalmado, o bigodão então assim para mim:
Bom e bem-haja atão assim, q’atão assim é bem melhor. Em-fim, sempr’aforam duas semanitas estas de quétude & sossego, pois atão num foram?
E eu (ou: mazeu), resguardando-me a caneta & guardando-lhe rancor, abandono o proscénio, sem nódoa que caia onde
CAI O PANO.

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Canzoada Assaltante