20/01/2014

BAILE SOZINHO ou O INVERNO DE QUELUZ, 48, Leiria, manhã de 11 de Maio de 2013, sábado

48

Leiria, manhã de 11 de Maio de 2013, sábado


Para onde vai o mundo, digo, onde se metem
as pessoas que ao meio-dia desertam a feira?
Por que imperioso desígnio fica tudo tão vazio?
Ao cabo de tantos anos de trabalho, adentram-me
a escrita esta preocupação e outras afins, não sou
um narrador de viagens heróicas, nunca fui

tal coisa. Tenho pelo menos essa decência, já não é
mau de todo. Pela tarde, hei-de desertar, eu mesmo,
que feira? Já o Rio me chama, faz sol o ar,
há, ou dá-se, uma brisa decente & refrigerante,
uma pessoa pode flectir pelas bandas do realmente,
a écloga é possível e até provável no sábado.

Numa tenda beira-fluvial cozinham peixe em água-de-tomate,
a álea de freixos fica perfumada como uma sacristia,
muito eu gosto de sentir a felicidade simples das merendas,
que são lentas e lautas e pobres e tão dignas e tão históricas,
é uma bela coisa o anonimato do Povo, nem tudo
pode ser triste, devo insistir que não para sobreviver.

Ponho-me então a grafar sem a fúria já dos primeiros anos.
Daqui a pouco vou para casa algo valetudinariamente.
Sou tão português de aldeia, que chego a adoecer só
de pensar seja no que for, alguma coisa se me avariou
talvez para sempre, mas nem assim o pus do medo
me infecta a constância, o pão das pombas & o Diabo-por-ele.

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Canzoada Assaltante