26/01/2011

Ideário de Coimbra - 151 (fragmento 2)


Berenice Abbott
El at Columbus Avenue and Broadway c. 1935-39
© Berenice Abbott/Commerce Graphics Ltd, Inc.


Serei humilde e arrefecido como a Noite.
Enquanto as casas bordam bairros, serei.
Sonharei um pouco ainda com pessoas amigas.
Os que se chamam Sousa, Tavares, Antunes, Reis.

Vou a caminho, guarda-me um pouco de água branca.
No Douro, a natureza dos homens floresce encostas.
As pessoas que foram para França sonham perdizes.
É por vezes terrível alimentar anjos-da-guarda.

Cuidado, conheço um casal feliz!
Rondam a casa própria como irmãos de sempre
& sangue.
É especial, isto de escorar com versos a terracota

do dia-a-dia.
Uma pessoa pode quadras escrever e não ter
de ser punida por isso, pelo menos é
o que acho quando a humildade me violenta.

Azeitonas, navalhas, luas & bailes
reverberam fragrâncias de quando em casa
ninguém me tinha morrido, aquando,
amando, laranjas e águas se compenetravam.

Fiz hoje uma prosa a partir de um homem
com cão & mulher.
(Mas é verdade que isto é Coimbra, Calhabé,
um entardenoitecer de Inverno, segunda-feira.)

Quando reflorescer não puder já,
recordarei a Berlim não visitada,
a Figueira dos Gelados Rajá
e a Cruz dos Morouços e a Cumeada.

Terei sido meu futuro anterior mesmo.
Um colector de rosas verbais, menos ou mais.
Terei sido de gatos e pardais sem distinção,
que tal é a minha e foi, será, a condição.

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Canzoada Assaltante