De milhões &
anos aos trinta de cada vez
1 Se, como desde
sempre planeei e planeio, conseguir viver aritmeticamente um ano mais do que os
77 totalizados pelo senhor meu Pai, em 2042 estico os pernis. E hei-de
esticá-los pela mesma ordem com que, vivo, os enfio nas calças: primeiro o
esquerdo, depois o outro, depois o outrinho. Se assim for & vier a ser,
isto significa que hei-de estar bem morto há já três anos quando se cumprir o
multimilionário tridecénio de investimentos agora publicitado pela empresa municipal
Águas de Santarém. Mas – ou muito me engano ou nada me deixo enganar: ainda por
cá hei-de andar de escorreitos costados sem que ninguém por então se lembre já
deste Excel muito giro de 30
milhões/30 anos.
Quê?
929 mil ainda este ano? Quê? Milhão e ½ em 2017? Quê? Um milhão vírgula quatro
em 2018? Pergunto eu: e haverá ainda Tejo para tanto milhão pingão? Hum. Estou
como as galinhas: adoptei esta postura. Hum. Parece-me que isto é mais dar com
os burros nas águas (de Santarém) de bacalhau. Hum. Isto parece-me pueril
irresponsabilidade dos miúdos camarários.
2 Entrementes, Passos
Coelho, ubíquo & exasperante como a micose, anda por aí angustiadamente
angustiado à trela das consequências indivíduo-sociais do peso dos impostos
& da tonelagem da austeridade obrigatória. Anda, anda. Hum. Cheira-me a
ressabiado. Digo(-to) eu, Pedro: é preciso ter(es) uma cara de pau emoldurando essa
boca de caruncho. Ou então um coração vácuo. Ou então um sótão craniano sem
inquilino encefálico. Ou então isso tu(do) segregando o nada de tu(do) isto.
3 Mas por ora, aí o
temos, qual a colossal livro – o Verão, cujos dias facilmente são páginas
brancas, que não em branco todavia, antes sim varadas de caracteres
iridescentes, antes sim ilumin(ur)adas de mísseis florestais despenhando-se
perpendicularmente no mar do céu. As praias fervilham de celulites apetitosas
como cascas de laranja espremidas a leite. Pelo entardenoitecer, numa
conjuração de violetas à la pintor
paisagista, as pracetas juncam-se de vestidos leves à pele de ginotortulhos
pesados mas gráceis, mas levitantes, mas torrados do iodo do dia solar &
platinados do luar perpétuo-enquanto-dura do comércio sazonal. O Império
Salazar-Colonial sobrevive no casamento da sardinha assada com a caipirinha
enregelada. Celebridades instantâneas como o AVC & como o Algarve publi’xibem
as pernas magriças à maneira de estacas palafíticas & enchumaçam as mamonas
moles injectadas em vão de silicone amolgado de tanto zezé-camarinha de
taxímetro fodilhão-local. Mas ora mirai: o autarcazito íncola de BTTcicleta
fazendo zig-gincana-zag pelas palmeiras de plástico que à pressa mandou plantar
à frente do aterro a céu-aberto. Oh sim! O Verão é bom! É bom como um sonho que
só há-de acabar quando nos esquecermos de que dormimos a vida.
4 Por falar em vida,
não sei se já Vos disse que conto tê-la, à vida, e ela a mim, por mais 26 anos
de hoje em diante. Dito assim, parece o que é: pouco. Mas ao menos não me há-de
custar um milhão por ano, como parece querer fazer-nos crer aquela miudagem
prestidigitadora do Excel (nunca Excelente) que me(n)tem águas &
milhões à frente de burros, bacalhaus, coelhos & demais patetas
arvoradamente bondosos – tudo malta a quem, malgré
tout & enfim, desejo Verões enxutos & sonhos molhados até ao feliz
ano 2045 de vez & para sempre sem mim, página que hei-de ser, limpa &
finalmente, em branco.
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