Onze
milhões de Emplastros
É que nem Salazar teria sido capaz de tão alto feito: desmiolar toda uma república
mercê de um desporto dito rei.
Não recuo um milímetro nem tiro uma sílaba
ao título que escolhi para a crónica desta semana. Desgosta-me profundamente
toda a euforia de plástico que pelo meu País, por desgraça, grassa. Outra vez
as bandeiretas compradas nos chineses, caraças! Outra vez os patriotas da
boca-para-fora, chiça! Ainda e sempre a impossibilidade de ligar a TV, num
canal produzido cá, sem que os rebanhos de totós (quantos deles desempregados?)
não irrompam pela pantalha mui parv’alegres, micóticos como a sarna, amostardados
como o sinapismo cataplasmante – e de uma moral tipo impingem que já não vale a
pena coçar.
Eu gosto muito de bola, juro que gosto. Até
corri atrás dela que nunca me fartei, na minha remo(r)ta mocidade que não
volta. Mas isto é de mais: a alienação a granel de uma gente que não é senão
culpada da própria mi(s)tificação a que de tão bom grado se sujeita – e tudo sem
um ai, sem um vagido, sem um isto-é-tudo-muito-lindo-mas-então-e-os-contratos-a-prazo-a-dívida-externa-o-Estado-a-socorrer-os-banqueiros-o-petróleo-no-Algarve-o-nuclear-em-Espanha-às-portas-da-fronteira-via-Tejo?
Quem há-de rinchavelhar-se desbragadamente
com tudo isto há-de ser o Pepe. Todo o tuga
conhece este grande lusíada. Pepe
10 – Jorge de Sena 0.
Rui Patrício 5 – Miguel Bombarda 0. Renato
Sanches 4 – Passos Manuel 0. Quaresma 8 – Aristides de Sousa Mendes 0. CR7 1000
– Bernardo Santareno 0. E, de repente, a realidade: Portugal 1 – Islândia 1.
Já tive mais pena que assim fosse, seja
& continue a ser. Com os anos, o futebol foi & veio dando lugar, no meu
caso como na minha casa, a outras predilecções lúdicas: a gotinha de soro nos
olhos a horas certas, a pastilhinha de alopurinol para prevenção da artrite
gotosa, o copinho de água fria em jejum para lavar as vielas arteriais seguido
do copinho de leite morno para caiar a adega, o chegar cedo ao Café da Graciete
tal que a mesa predilecta de fazer as crónicas não esteja ocupada por algum
meliante que escreva para outro jornal.
Não, nem sílaba nem milímetro retiro ao
título. Tanto patusco também cansa. Tanto carneiro também farta. Tanta micose
também exaspera. E tanta idiotia também aleija. Ainda se…
Ainda se os gajos das quinas em campo
fossem, sei cá, o Damas, o Jordão, o Vítor Baptista, o Arnaldo, o Lourenço, o
Lemos, o Pavão, o Coluna, o Manuel António, o Travassos e o Matateu, isso ’tá
bem, isso é que era uma esquadra de ataque à maneira. E o Eusébio no banco a
descansar um bocadito sem ser para sempre como agora está.
E, claro, eu como treinador, que percebo
muito mais de ser emplastro do que certos 11 milhões de outros que eu bem cá
sei mas não digo quem são.
Sem comentários:
Enviar um comentário