Isto se eu fingisse lembrar-me,
disfarçasse saber do que falo
1. Das minhas felizes surtidas
cometidas às terras de arriba-Tejo, uma assaz recorrente gravura que em retenção
memorial se me impõe – é essa de o céu ser mais alto do que em outras
(p)aragens do meu País inicial & terminal – vulgo Portugal. É mais alto,
esse céu das lezírias subido. Ou mais chã, de diversos chãos, a perspectiva.
Outro lance: o da lezíria de húmus-água-verde formosamente perlada a negro pelo
touro ainda não chacinado em nome da barbárie chamada “tradição” tão característica de marialvas-monárquicos sem um livro
na vida. Outra: as colunas de silêncio vertical subindo o imo da Igreja de
Santa Clara, ali à santarena Avenida-de-Gago-Coutinho-e-Sacadura-Cabral, em
tri-nave clarissa-gótico-mendicante. Sim: a memória dá-se-me a arquivoltas
& a colunelos de rosácea. O esquecimento não usa pintura, nem usa
azulejaria, nem sabe o que talha seja – por isso mesmo que a Morte, que nos não
esquece, só ao Diabo lembra. Uma retenção mais, com V.ª licença: a de auferir,
ao menos, metade da máxima doméstico-epigráfico-heráldica do senhor José Relvas
(1858-1929), que “Glória e Vinhos”
era. Fico-me pela segunda parte, incapaz da primeira. Assim seja, que assim é. Incontornável
lembrança de subido cénico aparato é, ainda, a do Castelo de Almourol (Almorolan em 1129). Dele, as nove torres
arredondam outros tantos aparatos de lançamento rumo-espacial – e tantos
séculos antes do Cabo Canaveral dUSAmericanos.
(Intervalo agora para nótula
romântica: Foi na nabantina Ilhota onde roda a madeira hidráulica do Mouchão
que de amor se mutuamente irrigaram & irroraram o senhor Arménio Tomé &
sua doravante gentil senhora Lucrécia Vasques. Foi em 1950. Ela era de
boa-família, não sendo má a dele. Casaram-se de electrodoméstica vontade, pós o
inócuo ósculo semiamorangado de beiços virginalíssimos, na Igreja de Santa
Maria dos Olivais que, nos Mil-Centos-&-Tais, Gualdim Pais de propósito
reconstruiu para eles-Lucrécia-&-Arménio. O preto-e-branco das fotos
esponsais perpetua a mocidade do amor emoldurado pelo pétreo veludo do púlpito
de Quinhentos, pelo sorriso transparente de Nossa Senhora da Anunciação &
pela sacristia manuelinamente ajanelada. E foram felizes para sempre – durante
o sempre até 1981, ano da morte dele, e 1982, marca
terminal dela, que sem ele podia mas não queria nem quis.)
2. De Abrantes (a recordação não
é minha, é tomada de empréstimo a um pater-avoengo meu, vivo no Ano n.º 130
a.C., que era de gaio nome Caio como o poeta Valério Catulo e que integrou a
horda milícia de Décimo Júnio, geralcentudecurião Bruto a valer), isto: o
castro lusitano que então Roma tomou à força valia o chão do Castelo abrantino
subsequente. A tais politeístas de excelente Língua & Direito forte sucedeu
o monofásico Cristianismo, dedicando a Cidade à égide de Vicente & João,
santos, as igrejas maiores do rincão.
3. No retorno a Norte (a que sou
obrigado por falta de carcanhóis que me permitam aquisição de choupana palafita
nas avieiras Caneiras), passo pela Batalha. Já Ribatejo não é, eu sei. Mas é:
se arriba, tágide há-de ’inda ser a musa escrita. Ou assim: assim a morte de
Mestre Afonso Domingues causa, por obra suplente do catalão Huguet, a derivação
de mendicante para flamejante do soberbo estilo gótico, ora
já sem Clarissas como no Louriçal. Mas é que já escrevi(vi) sobre essa
epifania. Fi-lo assim:
4. - A Secreta Vitória
Fazem
as pequenas pedras os grandes edifícios. E pequenos, por igual ideia, parecem
os homens que organizam as ditas pedras de modo a que a História encontre
marcos no tempo que passa. Que passa para as pessoas, não para os monumentos.
A Batalha, toda ela, vila e mosteiro de Santa Maria da Vitória, evoca essa comparação. Não é possível, perante a beleza descomunal daquela pedra, evitar a íntima inquietude de sermos, nós pessoas, ínfima areia. E que só ela, junta e trabalhada pedra, é eterna.
Ainda assim, retenhamos de uma visita à Batalha (que é, como em tantos outros casos de amor, uma revisita) a noção de que a alma colectiva existe. E que olhando nós o que invisíveis e dissipadas mãos ergueram, também mãos damos ao que eles quiseram olhar por dentro e de frente: a alma da História, a nave do Tempo, as abcissas da Memória.
Visitada, revisitada, nunca esquecida, a Batalha exalta deste modo uma vitória mais secreta que a de Portugueses sobre Castelhanos: o triunfo da arquitectura sobre o esquecimento. Ou a morte da Morte, por assim dizer.
A Batalha, toda ela, vila e mosteiro de Santa Maria da Vitória, evoca essa comparação. Não é possível, perante a beleza descomunal daquela pedra, evitar a íntima inquietude de sermos, nós pessoas, ínfima areia. E que só ela, junta e trabalhada pedra, é eterna.
Ainda assim, retenhamos de uma visita à Batalha (que é, como em tantos outros casos de amor, uma revisita) a noção de que a alma colectiva existe. E que olhando nós o que invisíveis e dissipadas mãos ergueram, também mãos damos ao que eles quiseram olhar por dentro e de frente: a alma da História, a nave do Tempo, as abcissas da Memória.
Visitada, revisitada, nunca esquecida, a Batalha exalta deste modo uma vitória mais secreta que a de Portugueses sobre Castelhanos: o triunfo da arquitectura sobre o esquecimento. Ou a morte da Morte, por assim dizer.
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