O siluro não tem futuro
(sermão
aos peixes sem Santo António ao barulho)
1. Tenho para mim & por
certo que não é cabal a designação de siluro-europeu
para a nova praga que assola o imundiciado Tejo da nossa vida tágico-trágica.
Não é que esteja errada. É que está incompleta. Falta-lhe especificidade. Siluro-alemão. Assim é que está bem: siluro com alemão a seguir. É peixe tipo gato que come carne? É alemão. Come
os espécimenes mais pequenos? É alemão. Nem às avezinhas beira-fluviais permite
sossego? É alemão. Até o seu cocó é tóxico quando em aglomerado cardume? É
alemão. Tenho provas de que é alemão. Uma metàforazinha me serve de inegável
& indesmentível evidência. Esta aqui: O
Tejo é Portugal.
2. Portugal é o Tejo. Tal como o Rio sofre de poluentes (olá, Vila
Velha de Ródão!; olá, Mação – sim ou não?; olá, Abrantes!; olá, Constância!);
tal como o Rio se abaixa de caudal; tal como o Rio é entravado & bloqueado artificialmente
por enrediços exploradores desalmados; tal como tudo isto – assim Portugal
sofre de ofensas cumulativas ao seu ecossistema financeiro; assim Portugal se
abaixa de cócoras para enfermar de atentados incessantes à sua biodiversidade económica;
assim à ocidental praia lusitana
acode a maré-negra em formato de orca-de-água-não-doce made in Berlim & desovada em Bruxelas com o beneplácito viático
de Estrasburgo & de Wall Street.
3. Os Portugueses fazem de
sável, de savelha, de saboga, de barbo – mesmo os cuniculófilos. O eixo
Berlim-Bruxelas faz de silurus-glanis,
que é o nome latino usado para disfarçar aquilo que vos disse: que o siluro é
mas é alemão. Mas, ó pessoal piscícola meu compátrio, nota bem que o siluro só
é siluro por enquanto. Para nossa haliêutica desgraça, e caso nos obstinemos em
democraticamente seguir pela Esquerda, a voraz avantesma há-de passar ao
formato do bem pior & famigerado lúcio-perca.
Perca a gente a determinação, que assim desgraçadamente será como a gente se perderá.
4. Há muito que a máscara do
espantalho teutónico caiu já. Aquela bocarra grande é mesmo para nos comer, à
maneira do pedófilo lobo do capuchinho (precisamente, precisamente) vermelho.
Ao arrepio da nossa Constituição & ao atropelo da nossa Soberania, o
siluro-alemão quer (mais ainda) atirar dentuça omnívora via “alteração estrutural a nível (ou aníbal…) do rigor orçamental”, que é como se
diz em economês “mais roubalheira com
fartura, que a gente é que sabe, pode e manda”. O lúcio-alemão quer mesmo
irrevogáveis (sem ser à PP) as medidas que nos foram coelhamente mentidas como temporárias. O bicho não descansa
enquanto nos não infestar a Função Pública e nos não superhipermegagigataxar o
IRS. A furtiva besta de fundão fluvial há-de dejectar quanto puder quando em
cardume. Há-de continuamente alinhavar equipas
técnicas (olá, Octávio Machado!) infamemente capazes de menosprezar quanto
vale, sem ser em dinheiro, um centro de saúde, uma escola, um tribunal, uma
ponte, um investigador, um enfermeiro, um operário da Rical, um reformado, uma criança.
5. Dispomos todavia de uma
esperança sensata. Até leva, ou traz em si, o nome da nossa Capital. Refiro-me
à maneirinha boga-de-boca-arqueada-de-Lisboa.
É criatura lusitana, tem bebido uns copos e feito umas piscinas ali pelas
Ribeiras de Muge e de Almoster, parecendo que no Rio Trancão também. Ora, é
minha firme crença e minha férrea disposição que a boga não tem de ter medo do
siluro. O siluro é tosco, é gordo, é pesado, é aleijado, é grotesco, é
contranatura. O siluro-alemão rima com aberração. A boguinha nossa, não. É
miudinha mas é nossa. É quase irrelevante mas é (d)a gente. A semelhança
morfológica dela para com afins espécies ciprinídeas é a nossa própria
semelhança para connosco mesmos. A boga deve pôr-se em voga. A única
modificação que se lhe/nos pede, é esta aqui: que em vez de mandar(mos) bocas arqueadas, mande(mos) mas é o
vozeirão a direito. A boga não pode esquecer-se de que duas vezes no século XX
o siluro-alemão se armou em super-espécie invasora – e que duas foram as vezes
em que foi arpoado à maneira na corneta. A boga deve acreditar que às três só é
de vez quando o peixe se deixa morrer pela boca. Ou quando não passa de
carapau-de-corrida.
Ora, a maneira que temos de interditar o futuro ao siluro é fazer-lhe
ver, e de vez, que, para quem somos, bacalhau já não basta.
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