Como, pequeno,
chocolates
Momentos
há e hei em que não padeço de metafísica. O desencanto da idade favorece-me
pontuais clarões de raciocínio mais terreno. Do preço das conservas à recusa
(por razão de higiene mental) de assistir a debates eleitorais, recrudescentes vertentes
pragmáticas despoetizam-me cada vez menos raramente. Isto tem, é claro, seu
preço, que não é o da chuva nem o da uva-mijona: distraindo-me menos,
contraio-me mais. É mesmo assim, podeis acreditar-me.
Vivemos
tempos de comunhão entre música e pulseiras: electrónicas estas como
electrónica aquela. Por seu lado, a dita “Imprensa
de Referência” serve. Servir, serve. Não presta – mas serve. Serve o quê? Serve
a quem? Ao cidadão, não. Ao empreiteiro, ao sucateiro, ao banqueiro, ao
pantomineiro – sim. Não gasto nem gosto dela. Em alternativa a tal lixo tóxico,
passeio-me. Não por distracção, não para segregar utopias. Sim por lucidez, sim
por contemporização para comigo mesmo.
Olhando
a montante como a jusante, assisto à podridão recrudescente dos rios – pelo que
não peroro sermões a peixes aliás mortos. A honra agrava-me a solidão. Mas não
é só que estou, note-se bem. Há mais gente honrada (e bem melhor ela do que eu)
que ainda é cívica, que ousa ainda ser pró-activa. Santarém tem, aliás, dado
cartas exemplares neste campo. Andam por aqui pessoas despartidarizadas que
mostram, demonstram e intervêm até. Não cuida, tal gente, de politizar a
cidadania, mas sim de civilizar a política. Se são “esquerdelhos”? Se são meramente “megafónicos”? Se são tão-só um punhado de reformados que não cedem
ao langor do bingo jogado em pantufas? Talvez. O que sei de fonte-limpa é que
limpam fontes, tais pessoas. Promovem cultura viva, agremiam encontros,
confrontam o Olimpo pouco limpo dos “democratas”
eleitos com as evidências da terra, os fumos do ar, a recorrência dos fogos
e a putrefacção das águas. Em Santarém, que é no Ribatejo.
Por
causa dos interesses “geoestratégicos” da Guerra-Fria,
a Península Ibérica perdeu, a partir de 1945 (no pós-II Guerra Mundial, claro e
portanto), três décadas preciosíssimas: salazarismo e franquismo duraram até
meados da década de 70/XX. Como não vale a pena chorar sobre o leite derramado,
nova oportunidade nos foi dada, a nós Iberos, em 1974 e em 1975. Que fizemos
nós? Continuámos fantoches de tiranias, mais adocicadas estas porém: alegadas
uniões supostamente europeias furtaram-nos a soberania, manietando-nos, a nós
títeres, mercê de muita areia nos olhos, muita palha na boca, muito cotão nos
bolsos e muito ontem no dia de amanhã. O resultado estaria à vista, não fôra
tanta areia em tanto olho.
Mas
calma. Cuidado com a amargura. A amargura pode ser existencial, mas não tem de
ser essencial. Primeiro, o físico; o metafísico, depois.
Sim,
tenho comido chocolates como a pequena do Álvaro. Mas palha – não, não a como.
Falta-me o vegetarianismo acéfalo & acrítico para tal. Nem sou bipolar, nem
vou em bipolarizações do “sistema”. O
preço da lata de cavalas é-me mais crucial do que o que diz o PS+D. Entre o pão e o circo do velho latino Juvenal, acho prioritário o pão. Não é o
biscoito. É o pão. Se não abundância para todos, suficiência para todos. Com
parcimónia, a vida dá q.b. de si antes da inexorável morte, esta sim
democrática, justa e irremediável. E para todos.
E
pronto: lá voltei às minhas metafísicas tolas. Mas não faz mal. É bonita a
manhã de Setembro. Já escrevi. Agora, vou passear – coisa cuja imitação
vivamente recomendo a certa imprensa e
a certa cam(b)ada de parasitas, que todos sabemos quem são mas que também, por
areia e/ou por circo, teimamos merdafisicamente
em reeleger.
Agora
eu é que não, Álvaro, que pequeno já não sou.