Vivi um daqueles dias calados. Em casa, sem pressa. À noite, fiz um cozido e ouvi valsas de Strauss. Enviei correio, de manhã. Fui ao posto dos Correios e despachei papel e música. Já tinha tomado café. Voltei para casa.
Quase não cuidei das notícias do dia. O mundo pareceu-me idêntico à sombra do mundo. Escrevi um texto e enviei-o.
Em casa, viajei longamente: México (1934 e 1963), Xangai (1949), Hiroshima (1945), Normandia (Omaha Beach, i.e., algures entre Sainte-Honorine des Pertes e Vierville-sur-Mer, 6 de Junho de 1944), Paris (1938).
Adentrei também a vida do escritor suíço Robert Walser (1878-1956). A vida e o fim de Robert Walser. Walser terminou na neve um dos longos passeios por que trocara, há muito, a escrita. Cito J. M. Coetzee:
On Christmas Day, 1956, the police of the town of Herisau in eastern Switzerland were called out: children had stumbled upon the body of a man, frozen to death, in a snowy field. Arriving at the scene, the police took photographs and had the body removed.
Isto passou-se. Depois de jantar, abovinado pela calentura do caldo e da broa, pus-me a ouvir uma fantasia para clarinete e orquestra. Voltei a pensar em Walser, que só queria que o deixassem em sossego os burgueses, a ponto de voluntariamente se encerrar num sanatório mental muitos anos antes de a neve o ter ajudado a tocar a paz tão longamente desejada.
O cozido sobrou. Amanhã há mais.
Caramulo, noite de 22 de Maio de 2007
4 comentários:
Gostei imenso!
sempre hei-de provar essa especialidade. E eu que pensava que só fazias sopa.Não há nada que uma Sofia não faça na vida de um homem...
Entre a loucura e a solidão busca-se sempre algo melhor.
Um desafio se me permite! Como seria o seu dia com uma mulher como Virginia Wolf?
Já passei muitos dias (e muitas noites) com Virginia Woolf. Ela - nenhuma comigo. Vantagem dela.
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