Imitação de Inês H.
por Rui B.
Há
uma dúzia de anos entregues à bicharada,
vem-nos a calhar um zootécnico. Refiro-me, claro, ao engenheiro Rui Barreiro,
que, qual Lázaro, ressuscita do purgatório ribatagano e se propõe reconquistar
em 2017 o que em 2005 perdeu: a presidência da Câmara de Santarém. Vem um
bocadito tarde – mas vem a tempo, por não haver mais tempo a perder. Se vencer,
oxalá faça jus ao nome. Neste sentido: Barreiro resolve barreiras. É trocadilho
fácil – mas justo.
Como
não voto cá, é libérrimo que me sinto para bitaitar
alguns emolumentos à cena (triste) da realidade político-social deste
futuro interdito chamado Santarém (Cidade & Concelho). Fá-lo-ei
socraticamente: destruindo por ironia, reconstruindo por maiêutica.
Três
palavras-chave parecem ser as suas, a saber: “Confiança, Esperança e Coragem”. Deixe-se disso, senhor
engenheiro. Temos tido, por excesso que não por defeito, muito abuso de
confiança, de desesperança razões muitas – e quanto a covardia (vá, a palavra é
forte, troquemo-la por pusilanimidade),
e quanto a pusilanimidade, o senhor sabe, o senhor bem saberá. Não é, pois, de
palavras-chave nem de intenções-fechadura que precisamos todos – mas sim de
actos-abertura, de paredes que mudem de cor quando se lhes der por cima uma
chapada de tinta.
Até
25 de Abril próximo (boa data), diz o candidato que apresentará os nomes a si
& do seu projecto adjacentes & cúmplices. Oxalá tais nomes sejam, mais
do que próprios, apropriados. Não há-de ser difícil: isto aqui é joio, aquilo
ali é trigo. Joeire o que for preciso até que espigue o melhor. Não vá pelo
menos mau. Vá pelo(s) melhor(es).
É
confirmação do senhor engenheiro que fervilham discretamente “conversações com outras forças públicas do
Concelho para tentar encontrar entendimentos que permitam uma solução
pluripartidária estável”. Bem. Muito bem. Não se importe que o já velho
& relho apodo de Geringonça venha
a ser-lhe ladrado pelos que temem o passar da caravana. Fale pouco e ouça muito
as pessoas de bem, que Santarém as tem também. Vá beber um copo ao Quinzena.
Imperativa
como imperiosa lhe seja a noção de a política poder sempre, mas não dever
jamais, esquecer ser de/com/para pessoas que trata. Estes doze anos têm sido um
deserto maninho, estéril, inculto: e torpe e ignóbil – vil até demasiadas vezes
& soez não poucas. Barbudos embora, estes rapazes que lá estão não passam de imberbes a brincar às gilettes como os mais
crescidos. Para eles, progresso é
um hipermercado por cada cem habitantes. E se o não é, parece muito sê-lo. Olhe
o senhor.
Olhe
o senhor aquilo da EN 114, aquilo da balbúrdia viária ao pé da estação: que
interminável tragifarsa, verdade? Verdade. O prolongadíssimo encerramento sem
remédio à vista daquela via crucial (via
crucis, precisamente) é, em si mesmo, o retrato perfeito do corrente
executivo municipal. (Mas diga-o o senhor à sua maneira, que eu tenho chovido
no molhado e a mão também já me dói um bocadito.)
Outra
coisa não propriamente menor: o Tejo. Queira escutar os activistas apartidários
que a ele velam & por ele pugnam. Seja incisivo nessa escuta. Insista na
revisão equilibrada & pragmática do PDM-de-Santa-Engrácia a cuja
procrastinação sine die estes ineptos
inaptos nos têm condenado, a nós sem culpa formada mas com trânsito em julgado
na (não-)prática. Cá p’ra mim, o lixo real das ruas começa a ser varrido com
uma vassourada no lixo metafórico disto-d’agora.
Engenheiro:
chateie Lisboa, senhor! É no chatear Lisboa que a coisa se dá. Chateie Lisboa!
Vá lá fazer com que lhe passem cartão, ao contrário deste, que ainda piou vaguíssima & inconcretizadíssima ameaça
de entregar o cartão. Chateie Lisboa.
Incomode. Ralhe salivosamente com a secretária do ministro. Fume muito na
antecâmara do ministério. Leve merenda para o Terreiro do Paço. Leve campinos,
leve um rancho ou quatro, diga que se vai matar em holocausto público,
ameace-os com o terror da continuação do Ricardo. Ou então assim: ande muito,
marche muito – olhe, marche depressa & bem à imagem & semelhança da
valentíssima Inês Henriques, a gloriosa riomaiorense que, a pé, faz mais
depressa 50 km do que eu de bicicleta, eu com 35 anos de tabaco no pulmão ainda
em vigor, no hálito, na roupa e na vocação de cinza-um-dia como toda a gente.
(Já agora, senhor, dê-me-nos lume.)
A
sério, muito a sério, senhor engenheiro: imite a Inês. Desta vez, o senhor não
terá como concorrente uma medíocre criatura de televisiva génese – mas sim
alguém cada vez mais ninguém neste frei-luís-de-sousa
mesquinho de que Santarém não tem de continuar sendo palco.
Confiança, senhor. Esperança, engenheiro. Coragem, Rui.