(ilustração gamada ao diário PÚBLICO)
Aquilo da gralha no
livro da Eduarda Maio
A
derradeira terça-feira do corrente Novembro amanheceu mais respirável. É talvez
da barrela da chuva recente – ou será das notícias, que nem sempre são más ou
reles?
O
senhor Custódio parece mais ligeiro, dançarinos quási seus passos rumo à
alfaiataria que de seu bisavô vem já. Nem o bisavô Custódio alguma vez facturou
um milímetro de fazenda a mais, nem jamais o Custódio bisneto branqueou lã da
Covilhã sem ser a giz macio.
A
ti’ Pureza (que arrenda quartos mas o declara às Finanças) também apresenta
hoje certa renovada seda-rosa na carita miúda e portuguesa. O sonho dela sempre
foi estabelecer-se como porteira de prédio de luxo em Paris – mas Paris é chão
de que roubaram as uvas.
O
Raul Faquir Arrumador, que mama malvasias de manhãzinha como um campeão do
santo-cálice (dizem uns que por desgosto de amor, outros que não, que nada
disso, que é por amor & gosto à malvasia ponto-final), madrugou hoje de
meia-de-leite & torrada-margarina nos queixos.
Os
pintores por conta do Rafael das Obras desunham-se pró-terminação
hoje-ainda-o-mais-tardar-ontem da empena principal da Junta de Freguesia, que
há meses andam naquilo sem retoques finais à vista. E o Rafael desconta como
deve ser para a Caixa deles e ajuda-os no IRS de cada temporada.
O
tudólogo do bairro, por apodo
certeiro Chico Corno, que mais fala quão menos sabe, à semelhança das comadres comentadeiras da trubisão, garante a quem o quer ouvir que “aquilo em Évora ainda é do melhorzinho p’ra preventivas
cinco-estrelas, muita sorte teve ’inda o gajo de não ir para ao pé dos
pedófilos e dos romenos”.
Por
ser terça-feira de liga-dos-campeões,
o Esteves Barbeiro só quer mas é que o seu/dele Sporting não acabe empatado
como o Bloco de Esguelha. Corte por
corte, à política e à ladroagem não liga pêva.
A
Clotilde Viúva, que leva as cartas do tarot
para o ioga na inquebrantável fé do monitor de reiki, é que está danada consigo mesma por não ter sido capaz de
adivinhar o descalabro da preventiva do Coiso, ela que tanto se fiava nas
procuradorias-gerais do laissez-faire-laissez-passer
tão ao gosto dos apologistas do se-não-fosse-este-era-outro-qualquer-como-o-que-vem-a-seguir.
E
eu, que gosto mais de biografias alheias do que da minha própria vida, eu
unto-me de gozo por ter dito desde o primeiro dia que aquilo no título da
Eduarda Maio era gralha grossa, que o correcto seria, e é, O Menino do Ouro, não de.
Entrementes,
à flor viva do Rio, os patos gargalham mais alto – parece-me cá a mim que sim.
A esquadrilha pombal, que sempre preferiu a migalha certa de cada dia ao
improvável mi(ga)lhão da candonga peculata,
ronda-me as botas à cata do honesto arroz-trincado e do honroso milho-partido
com que há tantos anos celebro das aves a filosofia do sustento-de-cada-dia.
O
único senão para todos nós aqui do Bairro 10 de Junho é não se ter ainda ouvido
falar, pelo menos até ao meio-dia não, de submarinos.
Ó felicidade passageira – és uma doca-seca.
Sentencioso,
teixeiradepascoaesmente, o nosso decano, ti’ Abílio Cuco, a meio da taça de
cevada é desta concisão lapidar:
–
Ninguém que trabalhe tem tempo para
juntar 25 milhões. Que trabalhe.
Honestamente. Ninguém.
Évora,
pois. Para já e por enquanto. Ou por encanto, Eduarda.