26/11/2020

VinteVinte - 141 (III primeiros - e sem tesourada)


 

141.

 

AGOSTINHO, NÃO FAÇO IDEIA D’ONDE

 

Coimbra, sábado, 12 de Setembro de 2020 (I)

Coimbra, domingo, 13 de Setembro de 2020 (II-III)


 


Provenho de um país restrito, delicado, portátil. 
Alguma educação permite-me habitá-lo na íntegra. 
Ela mesma me faz lograr o mar em terra plena. 
A uma lareira, a sós embora, mantenho companhia. 

Conversando, milhas terrestres & náuticas irmanam-se. 
Um diz-nos de sua mãe italiana, formosa, definitiva. 
Outro, do que penou em orientes insensatos. 
Eu mais escuto do que profiro, à cautela. 

Atrás de nós, franca & farta, a mesa com vitualhas. 
(É como nos sonhos, só que em papel.) 
Pessoas passadas de idas vidas são evocadas. 
Episódios mínimos de microvidas fazem-nos sorrir. 

Fazem-me sorrir, mesmo se o vazio é o que miro. 
Um homem resiste sempre até não ser corpo. 
Sabendo inexistir o além, vale mais o aquém. 
Como quando acendiam fogueira no largo para todos. 

Sumiram-se cerce & céleres os a que chamei meus. 
Pastoreio-lhes a lembrança por serras que nem vejo. 
Gosto das pedras, milenárias todas elas, resistindo. 
Gosto dos carreiros tortuosos & pisados quais destinos. 

O meu país envelhece comigo, mas olhai bem: 
o de as minhas Filhas, delas & nelas rejuvenesce. 
Natural lei que do humano não depende, portanto justa. 
As décadas confirmam-no sem excepção. 

Não é mau irmos aprendendo as constantes vitais. 
Nasce-se sem defesa, felizmente ignorantes. 
Depois a coisa melhora, há os tais carreiros. 
A hora vem de extinguir-se o lume. 

Muitos somos os náufragos, legião de sozinhos. 
A verdade é desaprendermos a temer ques ou quens. 
Não importa. Um pátio chega para tombar morto. 
Não é preciso palacete nem panteão. 

Outros virão. 
Mas, olhai, não: 
não a pessoas me refiro 
mas a poemas. 
Este meu é o país deles. 

(II) 

(Ela sempre, como o sol, radiante. 
Sempr’ela, como a rosa, radiosa. 
Salão celeste à lua exuberante. 
Dona de seu segredo, capciosa.) 

III 

Saí um pouco este domingo, vi as casas do alheio. 
O rio nos sítios dele, o arvoredo q’inda resiste. 
Coimbra é um bom deserto, ninguém existe. 
Anda-se à bel’-vontade, o mundo nem é feio. 

Toquei pessoas, cujo botão é disponível. 
Desataram todas logo a dizer-se. 
Eu penso que há sempre matéria sensível. 
Preciso é que ninguém vá com tal ofender-se. 

Onde estará Agostinho, que aqui trabalhava? 
Q’será feito de quem se desfez desta história? 
Onde a dos Areias? E a dos Peres, q’andava 
a reparar limalhas da metal-escória?

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Canzoada Assaltante