21/11/2020

VinteVinte - 132 (tudo, que é p'ra não fazer dois fretes)



Falemos um pouco ’inda desses domingos antigos 
Quando moços casais pontuavam o parque fluvial 
E o ar se azulava lavadamente sobre as casas brancas



132.

 

FALEMOS UM POUCO ’INDA

 

Coimbra, quarta-feira, 2 de Setembro de 2020

 



I

Peregrina-se mesmo sem se sair do chão sob os pés.
Até que a hora chega & soa de ser-se chão.
A vida arterial é de uma autoridade sozinha.
Há que limpar o próprio canto, ilusão nenhuma.

Essência-existência-r/existência – único jogo.
A impureza é? Modos há com que lixiviá-la.
Ruínas – umas nobres, outras recém-edificadas.
As aves sim permanecem superiormente.

Lá fora, ética, estética, remediação & curação?
Precária, encontrável, precária, improvável.

Resta peregrinar em consistente persistência.
Este condado ainda o franqueia com pertinência.

II

Procurei & encontrei ontem, nesta casa mesma,
palavras & fraseados de diversa validação.
Um homem da Arrábida purificou referências.
Um homem de Lisboa sobrepassou seu passado.
Outros foram apenas imitações-de-home’zinhos.

Todos enfim vão fazendo por suas vidas.
Alguns, é verdade, já não; morreram, são papel.
Sentado neste leito mesmo, li sem sobressalto.
Sei mais hoje do que anteontem.
Ou seja: tenho mais que, para & por esquecer.

III

Hoje desprezo mais calmamente o que é de.
Para alguma coisa leio bem, enfim.
Amo com pontaria o que nem amor pede.
Onde fica a pedreira, imagino o jardim.

As novas religiões são afinal velhas.
Não são antigas – são velhas.
Não são vetustas – são velhas.
Não são claras mas adustas.

Os rebanhos comportamentais são pindéricos.
Pugnam, sem nada saber, pela d-existência.
Jovens de idade embora, são de roxos cadavéricos.
Não lhes dou sequer minuto de paci’audi’ência.

(IV)

(Amanhã é dia de visitar o meu Irmão Zé.
Hora de fazer chegar-lhe, na doença, presença.
Estamos ambos em nosso milénio sem fé.
Do que se sente, parece, vem o que se pensa.)

V

Falemos um pouco ’inda desses domingos antigos
Quando moços casais pontuavam o parque fluvial
E o ar se azulava lavadamente sobre as casas brancas

Não te parece que o devamos fazer hoje ’inda?
Fá-lo-ei a sós pois, não há que forçar-te o modo

Era em domingo recente de si mesmo
Era à beira-rio, subiam no parque os plátanos
E a cor da tarde não ameaçava, pintava só

É claro que tu & eu nenhum de tais casais somos
Posto que ao porvir inabitável teimas habitar

Prossigamos a sós portanto um sem uma
Quando o barco-mensageiro aporta ao pequeno cais
E quem gosta de barcos logo se achega a mirar

É indecisa, inefável até, a estação d’então
Talvez meã primavera, talvez incipiente outono
Estio não é ’inda ou já, nem invernosa sazão

Não podiam então mais as máquinas do que a grei
Nem o analfabetismo era tão diplomado
Nem os animais eram tido por excedentes


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Canzoada Assaltante