13/05/2022

REGISTOS CIVIS - 118

© DA.


Ausenda– 118

 



    Vem-se-me volvendo mais insidiosa a premência de produção daquela vaga narrativa de que Vos fiz si(g)nal na entrada 107. Não há-de ser hoje, pois que hoje é dia de ir ao funeral da ti’ Ausenda, viúva que era do ti’ Armando & mãe do meu saudoso Amigo Tónio, para além do Zé, da Maria & do Valdemar. Revejo-me, pois, na contingência de sinalizar a amigos sobreviventes quanta solidariedade me é possível. Não me esqueço da multitudinária acorrência de pessoas aos meus funerais de família.
    O Tempo, matador de excelência, vinca & vinga todas as dobras da existência – toda a existência, não tão-só a humana. (Sei muito bem ser banalíssimo o que acabo de escrever – mas nem por isso deixa de ser vero.) Tudo isto, porém, está em mármore-perpétuo por mão do maravilhoso Proust: “(…) o Tempo ordinariamente invisível, que, para deixar de sê-lo, vive à cata de corpos e, mal os encontra, logo deles se apodera a fim de exibir a sua lanterna-mágica.”.
    Hoje, Sábado-26-do-3, vou ao funeral de uma senhora que toda a vida se estruturou pilar-contraforte de sua casa-família. Sim, uma dessas mulheres de cimento-armado que sustentam a borboleteante efemeridade dos machos que ou de quem parem. Sou filho de uma destas tais. A organização que sou não dispensa essa consciência, essa idade – essa perene pertença. Ou dito assim: mátria-biológica.
    Em pouco tempo saberei (o funeral é às 14h30m, são agora as 12h17m) a idade final de Ausenda da Costa Alves (7-7-1935/25-3-2022) – mas sei de cor a de Eça quando em 1900 morreu: 55 anos. Lamento, como a uma perda pessoal, que ele não tenha resistido (ou r-existido) meros treze anos mais, tal que lhe fôra possível ler o proustiano primeiro-tomo da Recherche. Que acharia ele da monumental obra-prima? Achá-la-ia de facto monumental, como prima deveras? Eça morreu demasiado cedo, todavia tendo chegado talvez a conhecer aquilo a que o lapidar Proust designou por “a douta fadiga dos velhos”.






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Canzoada Assaltante