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03/05/2020

VinteVinte - 24 (corrigido e aumentado)





24.

HÁBITO DO ÓBITO



Coimbra, domingo, 5 de Abril de 2020 (I)
Coimbra, segunda-feira, 6 de Abril de 2020 (II)
Coimbra, terça-feira, 7 de Abril de 2020 (III)
Coimbra, quarta-feira, 8 de Abril de 2020 (IV-VII)




In memoriam viva de
Álvaro Augusto Antunes dos Santos
(19 de Outubro de 1959 – 5 de Abril de 2020)

I

Morreu hoje, Domingo, 5 de Abril de 2020, o meu Amigo Alvarito, Álvaro Augusto Antunes dos Santos, filho de Diamantino & Cidalina, irmão do Luisito, pai de Adriana & Filipe. Nomes de gente de quem mal não vem ao mundo. Antes pelo contrário, que a todos conheci desde que me fiz gente. Família de trabalho, personalizada, referente de hombridade. Gente que passa de moda, nestes tempos apressados do mais vale parecer do que ser.
E agora, de repente, o Alvarito. Não o levou o vírus da moda destes dias aziagos. Sei pouco. Dizem-me que sofria de hipertensão cardíaca. Uma altercação de rua (verbal, não física) com alguém, que aqui não interessa nomear, perturbou-o a ponto de desfalecer, primeiro, e falecer, depois, já no Hospital.
Éramos amigos. No ano passado, curtimos juntos alguns fins-de-tarde. Conversávamos: leituras, música, coisas pequenas e ideias grandes. Agora, somos quê, ele e eu? Não creio em deus algum. Não reconheço qualquer eternidade além-corpo. Somos quê, agora, o Alvarito & eu?
O irmão Luís, a cunhada Amélia & o sobrinho (Luís também) cuidaram dele. Guardaram-lhe as sáfaras cinzas em vaso vizinho dos de pai & mãe. Ele vivia a sós. Gostaria, eu, de crer que se reuniu a Diamantino & Cidalina. Por escrito, creio, enfim.
Assim eu me reúna aos meus, quando vier a hora do dia que traga em si essa noite que em todos amanhece desde a nascença.

II

Os meus cadernos vão volvendo-se hábitos-óbitos.
O Alvarito ontem, morto sem por nem para quê – como aliás se nasce.

III

Sim, os meus cadernos volvem-se epicédios, nénias, tristabundas elegias.
Num átimo, as vidas: a própria como as alheias, a noite maior do que os dias.

IV

Claridade encontremos,
caridade não busquemos.

V

Sei mais de ti do que tu de mim.
Tal verdade não me torna mais sábio, só mais triste.

VI

Não rejeito os dias – ajeito-os em idade.
Hei-de ir longe sem sair daqui.

VII

Chamar pastor ao sacerdote
&
chamar ovelha ao crente
– não ofende.

Mas chamar carneiro a ambos
– já é capaz de.

Vá-se lá entender as linhas tortas por que escreve o deus
de tal gado.

5 comentários:

  1. Muito obrigada Daniel, és um bom amigo.
    Bem haja pela tua homenagem, jamais será esquecida.
    Um beijinho!

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  2. Muito obrigada Daniel, és bom amigo.
    Bem haja pela tua homenagem, jamais será esquecida.
    Um beijinho, fica bem!

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  3. Nada há que agradecer, Amigos. Partilho a dor e o vazio. Oxalá que ajude um pouco.

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  4. João Pedro Antunes (ZITO)8 de maio de 2020 às 09:44

    És enorme amigo Daniel… saudades tuas!!

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