30/03/2017

CRÓNICA A MODOS QUE POLIPROPILÉNICA - Rosário Breve nº 499 - in O RIBATEJO de 30 de Março de 2017 - www.oribatejo.pt





Crónica a modos que polipropilénica



1 Se a estatuária moderna fosse feita do mesmo material que dá corpanzil aos mamarrachos eleitos, poderíamos morrer seguros de nos sucederem tais monumentos. Assim, como parecem ser (e deixar de ser) de polipropileno, de esferovite, de plasticina, de areia e/ou de barro que não viu forno – não.
Sim, andei por Santarém. É de facto uma cidade perigosa. Parece remontar ao constante temor bíblico das grandes calhoadas na mona à passagem pelos sopés das torres periclitantes a que o arquitecto medievo se esqueceu de juntar super-cola. A sério que andei pela bela e desprezada cidade que é Vossa como foi (e para sempre há-de ser) do Bernardo que era António, esse mesmo (Martinho do) Rosário não breve. Está bem, eu conto:
2 Cirandei pelo meio das estreitas artérias. “Pelo meio” – por me ter esquecido de trazer comigo material de desencarceramento capaz de libertar os passeios (os passeios já de si exíguos e opressos como o bafo dos asmáticos) da praga de carros que os juncam em perfeito aparato estacionante de selvajaria anticívica. Tesoura, ferramenta multiusos de acção dupla, rebarbadora, machado, picareta, expansor, extensor hidráulico, tudo à base de grupo energético calibrado e em bom trato de manutenção – a falta que de vós senti! Da próxima vez, talvez não me esqueça de juntar ao estojo do acordeão, à maneira de saca-pipos, o canivete de ponta curva que na puberdade me foi oferecido por um amigo interesseiro cujo pai era patrão de uma recauchutadora de pneumáticos.
3 A estas verdades tristes, junto uma desconfiança não-alegre. Esta aqui: sou capaz de ser eu quem leva tão arrastada invernia ao Planalto. Das duas últimas vezes, assim foi. A mais recente, pior do que a penúltima. Ora leiam:
4 O granizo diagonal vergastava a vetusta Scalabis ao colo de um vento de más horas, acudindo à nuca o arrepio glacial dos que de barriga para baixo esperam o gume da guilhotina. Tinha eu acabado de ser corrido do pórtico do W Shopping por uma faneca de quarenta quilos mas com farda de securita. Atirei o acordeão para dentro do estojo depois de recolher os dezassete cêntimos ganhos a tocar ao sentimento entre as oito e meia e as onze e ¼ da madrugada. Fiquei como estou há coisa de cinquenta e três anos menos 38 dias: sem norte nem oriente. Restavam-me o sul e o ocidente. Decidi-me, claro, pelo sul: indo pela Pedro de Santarém, chega-se num fósforo ao Quinzena.
5 Ainda não era a enchente. Serviram-me um quartilho, mas na condição de não usar o acordeão para tocar o Minho e Galiza, essa estremecedora marcha-de-concerto tão parideira de lágrimas viris e tão própria àquele transe em que o cabo dos forcados e o cavaleiro dão a volta ao arrebol com flores e lágrimas também. Bebi, o senhor Fernando ofereceu-me o gasto e a porta de saída, saí.
6 Cá fora, o mundo continuava imundo. A invernia contrariava o calendário: era já afinal inaugurada pelo relógio a outrora doce Primavera. Andei muito. Eu fiz Vale de Estacas, eu fiz S. Pedro, eu passei à Bonduelle, eu saudei sem abrir a boca os Casais do Mocho, eu desembestei-me pela 114 até Perofilho, eu parei à face de um monturo de lixo espontâneo para desfazer uma desnecessidade, e segui, segui muito, à passagem pela Jorge Cordeiro Automóveis Ld.ª já levava um bofe na mão direita & uma aguda vontade de jamais ter nascido na outra, e foi então que me pus a grande questão existencial que toda a humana pessoa mais tarde ou menos cedo acaba tendo de pôr a si mesma por não ter mais ninguém ao pé a quem pô-la: “Quinta dos Cardeais ou Secorio?”
7 Escolhi o Secorio. Por ser sexta-feira, havia mangusto de bacalhau na Associação Progresso e Recreio. Tiveram pena de mim e deixaram-me entrar, mas na condição de não usar o acordeão para tocar o Hino da Maria da Fonte, que fica sempre tão bem ou quando há bacalhau ou quando o vinho ainda se não acabou. Perguntei qual poderia então tocar para agradecer o extremoso manjar. Disseram-me que tocasse a Chula do Polipropileno, coisa que fiz sabendo o quão efémero é tudo na vida: a começar pela própria vida e a acabar nos conjuntos escultóricos da Santarém moderna, essa arte à la Moita Flores que o Inverno leva e a Primavera não devolve.


27/03/2017

MENINAS, VINHO VERDE & HOLANDESES ESQUISITOS - Rosário Breve nº 498 - in O RIBATEJO de 23 de Março de 2017 - www.oribatejo.pt



Meninas, vinho verde & holandeses esquisitos



Na semana passada, croniquei neste espaço de maneira sentimentalona e ateia. Já depois de ter enviado o texto para a paginação, ainda me ocorreu a possibilidade de vir a ser queimado em efígie pelos fundamentalistas do catolicismo. Não ardi, porém. Aconteceu com a minha crónica o mesmo que por aí acontece: nada. Qualquer protagonismo a que eu tivesse a veleidade de aspirar, na glória efémera da semana de vida útil deste Jornal, teria, de qualquer modo, sido pulverizado por isto agora do holandês esquisito (fisionomicamente parecido com o também esquisito Francisco Assis do PS). Falo do presidente do Eurogrupo, senhor de um nome cujo som parece o do prato do cão ao fazer-se em cacos pelo chão: Dijsselbloem.
Toda a gente sabe o que tal figurão-figurinha disse de nós (Portugueses, Espanhóis, Gregos e talvez dos Italianos também): que connosco é tudo muito bonito mas mais à base de putas & vinho verde. Não é que seja mentira, ó pessoal! Todavia, a acusação peca mais por defeito do que por excesso. Para mais, vinda de um gajo cujo país expõe as prostitutas em montras de pé-alto à maneira de talhos virados para as ruas por onde passam criancinhas. Para menos, vinda de um fulano em cujo país a ganza é mais livre do que por cá as andorinhas. Para tanto, vinda de um parasita cujo salário diário equivale a não sei quantos salários-mínimos cá da parvónia.
Peca por defeito porque não é só em putedo e copofonia que esbanjamos à larga. Não só. Também sustentamos subvenções vitalícias (e milionárias) de políticos como ele, canalha que sabe lá o que seja uma leira, uma oficina, uma escola no cu-de-judas. Também ombreamos a canga de uma dívida externa infinita, artificial e impagável que gajos como ele criaram do nada para sustentação ad æternum de meretrizes de gravata como ele.
Também mamamos o fel das recapitalizações bancárias ordenadas por gajos como ele no dourado dos salões extraterrestres em que vegetam as suas estéreis existências.
Eu sei o que o assusta: é aquilo do Brexit. O Dijsselbloemzito teme que, colando o exemplo, lhe tirem a gamela das fuças. Que nós, os tais pequenitos do Sul, lhe escaqueiremos a manjedoura com o braço do manguito. E que eles, Holandeses acólitos dos Alemães, tenham de ficar com as próprias putas para consumo-da-casa e de se verem reduzidos à vinhaça que, aliás, nem sabem fazer. Não se lembram de terem sido corridos a pontapé do Transvaal pelos Ingleses. Não se recordam de lhes termos nós, Portugueses, estampilhado o focinho a galhetas no Brasil que nos queriam roubar.
Quem prostituiu o sonho de paz duradoura no pós-guerra de 1945, e que esteve na base da concertação de uma pretensa unidade europeia – foram gajos como este imitador do ultra-ortodoxo Francisco Assis. Não fomos nós – que trabalhamos a vida toda por um restolho de migas em malga rachada. Não fomos nós. As nossas putas, senhor, são mais sérias do que as vossas. E a nossa pinga, da Porca de Murça à torreira do Esporão, passando pelo milagre em escada das Encostas do Douro, é incomparavelmente mais encorpada do que a mijoca sensaborona do vosso schnapps. A verdade fala pela minha boca como se um vento profético me arejasse as barbas no deserto, pá.
E ainda: ó pá, foste a três finais do Mundial da bola e perdeste-las todas. O nosso putedo e os nossos bebedolas, pá, são Campeões. Campeões de quê? Dessa mesma Europa que pensas ser tua mas não é. É cá do Sul, carago!


16/03/2017

DA INSANÁVEL INEXISTÊNCIA DE DEUS - Rosário Breve nº 497 - in O RIBATEJO de 16 de Março de 2017 - www.oribatejo.pt





Da insanável inexistência de Deus



Foi há mais de trinta anos. O filho de um Irmão meu ficou-nos doente de uma pneumonia séria. Filtrado pela urgência pediátrica, ficou internado com a mãe. Lá fomos todos, em aflita procissão, a saber dele, atulhando a sala-de-espera de uma ânsia inominável. Fazíamos óós com a boca como peixes de aquário não ventilado. Devagarinho, o menino convalesceu. Parecia um lírio transparente. A boquita de morango, gretada pela febre, ensinava-nos o código-de-barras da desidratação. Como sempre sucede em todo o resto de todo o mundo, as mulheres mostraram-se mais fortes. A Cecília não desamparava o filho da vida dela. A minha Mãe, a minha Irmã e as minhas outras cunhadas conluiaram-se num gabinete-de-crise que jamais vacilou no combate ao infortúnio. Nós, homens, meu Pai incluído, parecíamos pardais partidos à pedrada. Foi então que, no decurso da primeira visita autorizada, cometi um dos mais amargos erros da minha vida. Só agora, mais de três décadas depois, me sinto em robustez para contar tal passe.
Era no Pediátrico antigo. As regras de estadia e de circulação eram então muito mais relaxadas do que agora são. Com todos à volta do Ruizinho, dei-me à derivação. Da enfermaria dele, atraído pelo Minotauro da curiosidade, fiz-me ao labirinto. Dei por mim num dédalo sem retorno.
Sem médicos nem enfermeiras que me tolhessem o passo, adentrei uma enfermaria escurecida como noite privada. A um canto alto, uma luz-de-presença tiritava a febre de um amarelo glauco, um amarelo mau de pus quente. Quem me dera, hoje, não ter entrado naquela divisão irremediável. Mas é que entrei. E até hoje dela não saí – por causa deste pecado portátil chamado lembrança.
Era a enfermaria dos casos sem remédio. E era a demonstração mais cabal, mais prática e mais científica da inexistência de Deus. De qualquer deus de qualquer seita de qualquer superstição de qualquer cegueira & de qualquer guerra em Seu Nome.
Era uma menina, a primeira criança incurável que vi. As mãozinhas perfeitas e o rosto da mais desarmada e mais desarmante lindeza eram contrariados pelo capacete da hidrocefalia. O crânio descomunal, eivado de veias azul-cobalto estrangulando uma miríade sideral de róseos riozinhos, tornava aquela filha-de-alguém numa espécie insuportável de extraterrestre dos piores filmes. Senti de imediato a gravidade do meu erro e a indesculpabilidade da minha devassa.
Mais além, um menino. Tinha três anos de vida, apurei depois. Nesses três anos, só chorara. Era cego, era surdo, era de janelas fechadas a todo o exterior. Soube depois que, desenganados pelos médicos de toda a esperança, os pais daquele bambino insanável o haviam deixado ali para o que não desse e jamais viesse.
Não me lembro dos outros quatro, doze ou mil que ali jaziam. Fugi como o covarde que passei a ser até que a morte me chame pelo nome privado que a minha Mãe me chamava para lhe dar um beijo.
Calma, que isto ainda não acabou. Uma década e uns pós depois, encontrei-me no átrio do Hospital Novo com uma amiga. Chocou-me vê-la a chorar sem peias nem remédio. Afinal, ela era ali médica. O problema era ela ser daquelas pessoas clínicas que continuam a ser pessoas apesar do estetoscópio. Quis consolá-la. Não pude. Vinha de avaliar um caso perdido. Uma infantazita de quatro anos. Leucemia infantil.
Viemos, ela & eu, para este Café de onde vos escrevo. Finjo que ela, Dr.ª Maria da Conceição Saraiva Pinto Athayde, está comigo ainda. É fingimento meu. Ela não está. O cancro levou-no-la em Dezembro de 2007.
Escrevo de novo as duas palavrinhas que negam Deus: Leucemia Infantil. Pouso o lápis e faço como o senhor meu Pai fazia, que era isto assim: olho o mundo derredor e não encontro nele sinais quaisquer de qualquer divindade. Do Diabo sim – e por todo o lado.





09/03/2017

ENDECHAS ORGULHOSAMENTE SÓ PARA PORTUGUESES - Rosário Breve nº 496 - in O RIBATEJO de 9 de Março de 2017 - www.oribatejo.pt



Endechas orgulhosamente só para Portugueses



1 Havia a Caixa das bolachas e havia a Lata das bolachas.

As da Lata eram para os filhos.
As da Caixa eram para quando a Avó vinha.
Seguíamos a Mãe: nós filhos nunca tocávamos nas da Caixa.
É talvez isto que é preciso dizer à ladroagem bancária destes dias.
Pena é terem Avó & Mãe morrido já.
Continua a ser preciso ter lata, todavia.


2 Outra coisa que havia, ou passou a haver desde 1975, era Angola independente. Ao empate técnico da guerra, sucedeu-se o reconhecimento, inevitável aliás, da auto-determinação. Mas o povo Angolano não é independente, nada disso, longe disso. O colono de agora é apenas da mesma cor da pele. Uma família com uma quadrilha de “generais” – e está a plutocracia consumada. Mais me custa ter morrido cada homem, preto ou branco, entre 1961 e 1974 – para esta nefanda cleptocracia.

3 Daria dinheirinho, que nunca tive, para ler o mural do Facebook em, digamos, 1940, ano da Exposição do Mundo Português. Gozão, saborearia a preceito os dislates de pasmo, baba & ranho dos meus compatrícios ante as maravilhas de gesso & papelão dos pavilhões imperiais. Em secreto ficheiro, faria copy-paste das hashtags tributárias da magnificência do nosso “Império”, do nosso messiânico Salazar, do nosso nunca desmentido fascismozito-de-paróquia, do nosso Portugal-dos-Pequenitos-do-Minho-a-Timor. Mas quando éramos miúdos não havia Facebook. Havia os nossos Pais vivos. Aprendia-se muita coisa na mesma, que carago.

4 Parece que escrevi um palavrãozito. Já não vou a tempo de substituí-lo por alguma interjeição mais branda. Fica assim. No devido contexto, o calão é-nos tão natural quão uma tachada de feijoada, uma travessazorra a transbordar de cozido, o contentor inchado de lixo a deitar p’ra fora – ou uma écloga definitiva de Camões. Repare-se nisto de o reeleito presidente do Sporting Clube de Portugal ter blasfemado – ou bardamerdado os infiéis ao Leão. Mal nenhum, acho eu. Francamente: mal nenhum. É português, é só nosso. Antes isso do que ser gago. Independentemente de qualquer contexto, a portuguesíssima palavra "bardamerda" não tem rival. Aquilo da "saudade"? A saudade que vá bardamerda.

5 Não faço a mínima ideia do que sejam dez mil milhões de euros.

Não faço a mínima ideia do que sejam mil milhões.
Não faço a mínima ideia do que seja um milhão.
Mas de um gatuno, ah sim, tenho ideia.
De um vezes dez milhões deles.

Porquê? Fácil: porque somos dez milhões de pequenitos que, podendo, roubaríamos também o nosso naco em detrimento do vizinho, quiçá do próprio irmão. Ou do nosso filho, roubando-lhe o neto. Se vos parecer cru isto que digo, ainda bem. A factura falsa é a nossa vocação, não a reivindicação de um fisco mais justo, mais equilibrado, mais pertinente. É como dar uma moeda de dois euros para a-fome-em-Angola. É ou não é? É pois. Ou como ter saudade do tempo em que já tínhamos ido bardamerda mas não sabíamos, como ainda hoje não sabemos e como amanhã nos não lembraremos.
Que carago.




07/03/2017

LAUR’ÁGUA





LAUR’ÁGUA



In memoriam Laura Maria Macedo Trindade
(Leiria, tarde de Domingo, 5 de Março de 2017)



Morrinha.
Céu fosco.
Último dia do circo na cidade.
Solidão (de) esplanada.
Sem cor, as coisas todas a lápis.
A luz transdesaparece.
A noite é certa.
Morreu, ontem talvez, a Laura.
Laura Maria Macedo Trindade.
Era do Porto.
Deixou filho & filha.
Dorme-se muita em vida.
O rosto dela desatransparecendo.
Morrinha.



02/03/2017

DA FELICIDADE AO CALHAS - Rosário Breve nº 495 - in O RIBATEJO de 2 de Março de 2017 - www.oribatejo.pt





Da felicidade ao calhas



Há muitos anos que não resisto às montras das lojas de electrodomésticos. Quedo-me sempre ante cada uma. Fascina-me mormente a esquizofrenia dos televisores ligados a canais diferentes. O melhor daquele aparato, todavia, está na falta do som. São como os aquários. Como os aquários e como as lareiras, manam qualquer coisa de hipnótico que faz a vista não pen(s)ar. Ambulâncias que não gritam, carros da polícia que não uivam, idosos negrejando o granito das luras serranas, velhinhos urbanos aos saltos em fantásticas promoções de linimento milagroso capaz de embalsamar o reuma das articulações, flashes do carnaval permanente do senhor Presidente, planos mais ou menos demorados dos viga(c)ristas que protagonizam a corrupção-ao-milhão do momento, a recentíssima invenção das ondas gigantes da Nazaré, desastres matematicamente fatais ensanguentando as rodovias, rostos de bombeiros exaustos com o ígneo inferno por pano-de-fundo, apreensões de droga a granel, putos com armas, ex-maridos com catanas, divórcios gay de ribalta pindérica, supostos talentos canoros e instantâneos, o malar mineral do senhor ex-PR, a estupefacção ensaiada do senhor ex-PM, coacções preventivas de pais, filhos & Espíritos Santos, imparável afromuçulmanização daquilo a que outrora chamámos Europa, o comunismo evidentíssimo do Papa franciscófilo, o dobermanismo evidentíssimo do mastim da Rússia, os mais recentes tweets da cenoura maluca que USAmericanos entronizaram, a palidez indignada de Angola ante as coloniais suspeições de corrupção, outra vez o senhor Presidente dos Afectos passarinhando à beija-flor o jardim lusitano – e bola, sempre bola, muita bola, cada vez mais bola.
Há muitos anos que, ante as montras electrodomesticadoras, e sem estar sentado, espero a reportagem decisiva, muda embora, que mostre & demonstre a via que leve ao trabalho para todos, à escola deveras instrutiva, à limpeza definitiva dos rios, aos hospitais não sobrelotados, aos sábados de correios, postos de saúde e bibliotecas abertos todo o dia, à energia solar aproveitada em pleno, à capitalização do mar como tesouro sem fundo, à naturalidade do civismo como premissa de cidadania.
Não me parece que sequer uma destas coisas tenha esse televisor para me vender. Para me vendar, terá. Para me vender, não tem. Por conseguinte, lá me consigo soltar do pasmo hipnótico e vou à minha vida. Vou ciente de ser toleima irremediável esperar seja o que for de um País (e de um mundo) de máquinas mudas electrodomesticando um rebanho de surdos. E cegos. E mudos.
E, assim como assim, se calhar felizes – felizes como o senhor, senhor Presidente.

Canzoada Assaltante